sábado, 15 de junho de 2013

A periferia sangra todos os dias

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Ferréz é um escritor da Zona Sul de São Paulo. Nasceu pobre, estudou a vida inteira em Escola Pública e desde cedo contraiu o vírus da leitura, que o fez se apaixonar e, em muitas medidas, se salvar de um cotidiano violento do lugar em que nasceu e vive até hoje.

Ferréz me inspira. Sempre me inspirou. Descobri, em meados de 2002 que havia uma realidade muito difícil, enfrentada pelos moradores de uma região que eu não sabia sequer que existia. Ganhei em uma palestra dele na escola que estudei um livro chamado Capão Pecado e fui totalmente absorvido na leitura, conhecendo a realidade da região sul de São Paulo. O que mais me marcou nessa leitura era ver o quanto o lugar que eu morava também tinha todos aqueles problemas: era Guarulhos Pecado!

Agora, mais de 10 anos da leitura desse livro e depois dos meu interesses aguçados à época terem se transformados em estudo acadêmico e militância social, Ferréz aparece mais uma vez para inspirar meu coração e mente.

Esse texto dele, publicado no jornal O Estado de São Paulo é bastante intenso, claro e objetivo; o texto de alguém que se armou com as palavras e que fez a escolha de usar sua escrita para enfrentar a injustiça social tão característica do nosso sistema. O link para o texto está aqui.

Mais do que isso, Ferréz denuncia brilhantemente o que se vive na periferia de São Paulo e como a população pobre vem sendo tratada pela polícia cotidianamente, há anos, talvez séculos. O embrião da polícia são os feitores, pessoas contratadas pelos Senhores de Escravos no Brasil e que tinham o dever de manter a escravidão, reprimindo qualquer tipo de desobediência das escravas e dos escravos. Violência constante e legitimada pelo sistema escravista vigente à época.

Qual é a grande diferença entre esse fato histórico que os livros relatam e o denunciado pelo texto do Ferréz? O século, apenas. Os pretos e pobres, moradores da periferia continuam morrendo ao menor sinal de desobediência à ordem estabelecida, mesmo que essa desobediência seja apenas estar no bar, confraternizando. O pensamento da classe dominante deve ser “vai que em meio a uma cerveja e outra esses caras resolvam ir atrás do seus direitos enquanto povo, né?”.

É óbvio que polícia não é sinônimo de segurança pública. Nunca foi e nunca será. E eles matam por isso. E as pessoas morrem; muita gente morre.

Deve ser por isso que mesmo sendo legítima a revolta e o repúdio à violência da polícia e mesmo sendo totalmente descabível os atos de repressão sofridos pelos manifestantes que saem nas ruas de São Paulo para protestar, dentre todos os textos e as análises, fico mais uma vez com a do Ferréz. A polícia é violenta e repressora nas manifestações políticas da mesma forma como é violenta e repressora nas periferias. O foco é outro e só haverá mudança definitiva quando as pessoas passarem a se revoltar quando todas e todos apanharem, não apenas quando a classe média sangrar.

A Periferia sangra todos os dias.

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