Hoje encerramos uma
etapa em nossas vidas. Neste momento torna-se impossível não lembrarmos das
nossas primeiras impressões enquanto graduandos. Como se esquecer das primeiras
leituras? Especialmente àquelas que nos fizeram refletir sobre o que é
História... Lendo o grande historiador Marc Bloch, aprendemos que a História
poderia ser definida como a ciência que estuda os homens no tempo, e para
analisá-la precisamos considerar a importância do presente para a compreensão
do passado. Partindo desta idéia, relembramo-nos da trajetória que nos trouxe
até aqui.
Nossa caminhada no curso de
História da Unifesp foi marcada por diversas dificuldades e algumas pequenas
conquistas cotidianas, que trilharam o longo caminho percorrido que culmina no
dia de hoje, nossa colação de grau.
Todas e todos aqui presentes
trazem consigo, e se lembram agora, do primeiro seminário apresentado, das
dificuldades com a grande quantidade de textos para ler, o imprevisível fim de
semestre, aquele trabalho final que nos tirou longas horas ensolaradas nos
nossos fins de semana... nos lembramos também das estruturas de poder, das
posturas autoritárias... da recorrente falta de diálogo na construção do curso
e da universidade.
Também enfrentamos longas filas
nas Xerox e comemos mais vezes do que gostaríamos no bandejão... chegamos tarde
em casa, sempre perdendo horas sem fim parados no transito do Trevo de Bonsucesso.
Entrar no curso de História da
Unifesp significou para muitos conhecer Guarulhos sem ser pela paisagem a
caminho do aeroporto. Desembarcamos nos Pimentas em sua dura e acolhedora
realidade, que naquela época não tinha sequer seu terminal de ônibus, tampouco
o CEU. Apresentamos a muita gente a possibilidade da universidade. Apesar dos
muros sempre presentes, vislumbramos sua derrubada. E percebemos que uma
realidade em que universidade e sociedade não estejam apartadas, como muitas
vezes a academia deseja, é possível.
Com muita luta trouxemos o
Itaquerão e depois a Ponte Orca... Hoje há três linhas de transporte para
facilitar o acesso à Universidade de pessoas dos mais diversos lugares. Mas
ainda assim seguimos em busca de um transporte verdadeiramente público, de
qualidade, a todas e todos, nas mais longínquas periferias.
Nossa longa caminhada teve até
uma mudança geográfica, já que começamos no Pimentas, e terminamos aqui no
Centro, nas salas do campus provisório.
Apesar disso, é claro que também nos
recordamos positivamente do primeiro seminário, já mencionado... dos elogios
recebidos que nos deram a certeza de que estávamos no caminho certo. Nos vem a
mente agora aquelas aulas extraordinárias, que nos prendiam por 4 horas, as
vezes sem intervalos! Aulas que nos roubavam inúmeros suspiros, que nos
prendiam por horas e horas, dias e dias, absortos em pensamentos mil, percebendo
a gama sem fim de possibilidades que nosso ofício nos oferecia. Também nos
lembramos dos grandes debates travados dentro das salas de aula e nos
corredores da universidade, onde experimentávamos tudo o que aprendemos,
testávamos nossos conhecimentos, em jogos que ganhar ou perder não estava no
horizonte, o importante era a magia do espetáculo.
Lembrando da nossa trajetória
agora, nesse emotivo momento, podemos optar por um olhar positivo ou negativo,
dependendo muito do subjetivo de cada um. Mas se há uma coisa que aprendemos -
e muito bem! - nessa caminhada para nos tornarmos historiadoras e
historiadores, é que entre o preto e o branco de uma lógica antagônica, há uma
diversidade de cores possíveis.
Dentre esses distintos tons, para
além de lembrar dos momentos pessoais, bons e maus, propomos aqui uma reflexão
sobre as transformações pelas quais passamos enquanto sujeitos da história. E
que se estamos hoje aqui, tudo foi fruto de múltiplas determinações.
E hoje, ao recebermos na prática
o diploma que nos qualifica para o ofício do historiador, não deixaremos de
lembrar que ainda somos privilegiados por estarmos concluindo o ensino superior,
em um país que carece de democratizar o acesso às universidades.
Também fazemos questão de lembrar
que se terminamos o curso nesse campus provisório, foi por ter a certeza de que
um dia poderemos voltar para o campus do Pimentas, no nosso prédio, pelo qual
tanto lutamos, onde sentamos na sala de aula da graduação em História pela
primeira vez, e de onde nossos corações e mentes nunca saíram.
E reafirmamos nosso compromisso
com a construção de um projeto universitário cada vez mais capaz de lidar com
os novos desafios. Uma universidade que a cada instante se desenvolva por
alternativas inclusivas e integradoras; e sirva, em todas as dimensões, para
construir um saber de excelência, rigoroso e alinhado às reais necessidades
sociais.
Por
isso, para além da felicidade que é receber a certificação que nos constata
como profissionais qualificados em analisar as ações
do homem no decorrer do tempo, recebemos também uma missão difícil, mas
essencial, para os anos que se seguem a partir de hoje: a missão de que nós,
historiadores, não sejamos apenas os sujeitos que falam da História, mas
também, os sujeitos que a transformam.
Que
este dia se mantenha vivo em nossas lembranças e que estas transformem-se em
memórias, e que elas sempre permaneçam presentes, até mesmo quando se tornarem
passado: nosso primeiro dia enquanto historiadores formados.